terça-feira, 6 de junho de 2017

#livroselições - A ARTE DE AMAR


Poucos assuntos foram tão abordados quanto o amor. Nada vale sem ele, fuja enquanto pode, tenha a sorte de um tranquilo, tem que merecer, é redenção, é desgraça. Na mais acalorada conversa de bar ou nos ambientes da erudição, todo mundo já refletiu, ao menos por um momento, sobre ele.

Construções filosóficas à parte, no geral, nos consideramos entendedores do amor. Por direito, a propósito! Difícil quem não o vivenciou nas suas múltiplas formas. E dependerá disto a importância e o viés que se dá.

Há os que evitam por terem vivido experiências negativas. Apesar de, provavelmente, isso ter mais a ver com os envolvidos que com o amor. Mas o pobrezinho acaba sendo responsabilizado pelas ações de cabeças e corações confusos. Típico do amor. Tudo suporta.

Sempre pensei nisso como algo que acontece. Então, bastaria ter a capacidade de sentir sua presença para encontrá-lo, como um caçador de tesouros que arrasta um detector de metais pela praia na esperança de achar algum artefato esquecido na areia. E tudo estaria resolvido.

Mas Erich Fromm me tirou da cômoda posição de expectador. Ele afirma, em sua prosa poética, que amar é arte, ofício como outro qualquer. E, como tal, pode ser aprendido e aprimorado. Ou seja, ele afirma que amor é ação.

“É o amor uma arte? Se o é, exige conhecimento e esforço. Ou será o amor uma sensação agradável, que se experimente por acaso, algo em que se ‘cai’ quando se tem sorte? Este livrinho baseia-se na primeira hipótese, embora indubitavelmente a maioria das pessoas, hoje, acredite na segunda. Não é que se pense que o amor não é importante. Todos sentem fome dele; assistem a infindável número de filmes sobre histórias de amor, felizes e infelizes, ouvem centenas de sovadas canções que falam de amor e, contudo, quase ninguém pensa haver alguma coisa a respeito do amor que necessite ser aprendida.”

Essa concepção do amor romântico, centrada no “objeto do amor”, é coisa nova. Os casamentos foram, por muito tempo, contratos com objetivos sociais. Depois, passamos a procurar “objetos humanos” (na palavra do autor) que mereçam nosso amor, que correspondam ao melhor “disponível no mercado, considerando as limitações de seus próprios valores cambiais”, como típicos indivíduos de uma sociedade de consumo.

Nos preocupamos em ser amáveis. Os homens buscam poder e sucesso, as mulheres batalham para serem atraentes. Todos moldam seus trejeitos para encantar, para conquistar amigos e influenciar pessoas. Acreditamos que no amor tudo é uma questão de encontrar o objeto perfeito, e ser um, ao mesmo tempo.

Fromm diz que não poderíamos estar mais enganados.

O amor genuíno é visto no fazer. Por exemplo, nas ações da mãe pelo seu filho: suprir, cuidar, educar.

Quando há amor, responde-se pelo objeto deste. É possível perceber que a agressividade momentaneamente, por exemplo, significa medo, angústia. Porque enxerga-se, além de si mesmo, a outra pessoa em seus próprios termos.

“Amor é preocupação ativa pela vida e crescimento daquilo que amamos. Onde falta essa preocupação ativa não há amor.”

Imaginamos ativas as pessoas que trabalham, estudam, constroem casa, cozinha; enquanto que dedicar um tempo a refletir, em contato com a própria alma, é visto como passividade. Mas é passivo quem executa atividades obedecendo a uma ordem que não é a sua, é apenas impelido a isso; enquanto que somente estando livre é possível praticar o amor.
“O amor é uma atividade, e não um afeto passivo; é um ‘erguimento’ e não uma ‘queda’. De modo geral, o caráter ativo do amor pode ser descrito afirmando-se que o amor, antes de tudo, consiste em dar, e não em receber.”

Entremos então na questão do dar-se, tão vinculada ao amor. Às vezes, se assemelha a perder, ceder, abandonar, diminuir o pouco que se tem. Porém, é o ápice de nossa potência. Só damos o que temos, o que temos de abundante e o que fazemos com maestria.

“Dar é mais alegre do que receber, não por ser uma provação, mas porque, no ato de dar, encontra-se a expressão de minha vitalidade.”

Erich Fromm cita a passagem bíblica que relata a ida de Jonas à Nínive.
Mesmo odiando aquela cidade, o profeta faz a pregação aos ninivitas, conforme missão da qual Deus lhe incumbiu. No caminho de volta, uma árvore cresce de repente e o profeta se abriga e descansa embaixo de sua sombra. Mas ela é atacada por vermes e morre. Conta a Bíblia que ele se revolta com isso e Deus, pai maravilhoso, lhe dá uma bela lição de amor. Jonas importa-se com uma árvore que nada fez para que nascesse ou crescesse, então Deus não deveria poupar centenas de milhares de vidas que fez nascer e se desenvolver, mas que estavam, momentaneamente, desviadas de seu caminho e necessitadas de sua misericórdia?

Pra mim, esta foi a grande lição deste livro: quem ama age, faz, trabalha.

Porque amor é verbo.

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